quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Amaria

À Antonia Maria Nunes, mestra e amiga,
sem a qual essas palavras não se deixariam ler

À Maria eu dedico estas singelas palavras, com todo o respeito na desmedida do impossível dentro deste recinto aberto, recito que, embora merecedora de poemas em forma fixa, com versos metrificados e tudo o mais que um verdadeiro mentiroso seria capaz de compor, vai ter de contentardes com essa maledicente prosa poética, é tudo o que tenho.

A Maria, antes mesmo de se confessar artífice da palavra, deixou-se levar pela prosa fiada deste humilde discípulo que, embasado em Teoria, atreve-se a discorrer na prática o que lhe é concedido. Dos subsídios que provêm de Maria, vai tecendo timidamente sua literatura sem-vergonha, vã filosofia da linguagem. Integrante desse esquema de corrupção de palavras, algo que os linguistas chamariam uma desconformidade entre significantes e significados, a Maria é tudo, menos inocente. Se o poeta é um rufião, a Maria é a proprietária do bordel. A Maria é a medida racional das passionais orações às quais o suposto escritor se devota.

Amaria tudo o que não fosse mero vômito de idéias no papel. Inspirar não seria o verbo comumente por ela empregado, a Maria é um tanto quanto cética no que se refere a esses mitos românticos. Prefere acreditar no trabalho estético a que se dedicam esses marceneiros da palavra, sempre lapidando aqui e ali a estrutura, não se dão por satisfeitos tão facilmente. A todo canto levam seus instrumentos semânticos, sintáticos, lexicais...

Eis que emprego todas as conjunções adversativas para tentar entender que a Maria não se faz mais presente. Uma lágrima verte agora e faz de conta ser riacho, percorre o meu rosto rumo ao papel que se encontra entre minhas mãos. Juntam-se a ela outras e logo parece ser um rio caudaloso desaguando na foz do poema, borrando as letras e então se torna difícil trabalhar a linguagem de maneira literária... É como se depois de dois anos carregando a tua bagagem, ficasse tu nas gares e tenho eu de seguir sozinho, meio sem rumo ainda, perdido, perdido como um pobre bicho com os sentidos alterados. Foste a melhor companheira de viagem que já tive.

Amar ia, de coração este poema, não fosse que a gente finge não ter um quando tem nas mãos a pena. E também isso eu aprendi com a Maria. Mas meu pranto não é literatura, é vulgarmente sentimento, saudade anunciada de escutar teus dizeres toda semana ecoando em minha alma, teus saberes apressando a minha calma.

Ah Maria! Vai-te pela estrada da vida, ama, ria e segue o teu caminho que não é mais o meu. Tens aqui um admirador que por ti acreditou ser poeta, que bebeu da tua fonte de sabedoria e agora se submete ao crivo da tua severa análise, Maria.

3 comentários:

  1. "Ah, Maria, Maria
    Será que você sorriu
    Lembrando daqueles dias"
    Belas palavras Juliano...
    Também me sinto sem rumo, sem vontade.
    Sem quem me faça acreditar no ouro de minhas palavras.

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  2. Quando já existe o talento natural, a sensibilidade latente e o verbo fácil, que escorre pela pena, fica fácil: basta assoprar devarinho no ouvido e tudo começa a fluir. E vc é isso tudo a flor da pele! Essa é a mais linda homenagem que já recebi na vida! A crítica não é severa, nem poderia... deixei-me levar pela emoção e as lágrimas, vc sabe, turva a razão. Mas para que razão neste momento? O texto está perfeito! "com cada coisa em seu lugar". obrigada, meu bem. sds

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  3. Preciso dizer que vc sempre foi o olhar atento que eu procurava no meio de outros não tão atentos assim. Seu olhar ouvia com atenção e me devolvia a resposta que eu necessitava para continuar a discorrer o meu verbo livresco. Enquanto vc o interpretava como cobrança (das leituras não feitas rsrsrs), ele apenas estava buscando um interlocutor atento para dar sentido ao que eu fazia.

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"Respeitar o trabalho do outro consiste justamente em submetê-lo à crítica mais rigorosa" (José Borges Neto)