domingo, 22 de abril de 2012

Adultério

Vejo que aceitaste de bom grado o que te sugeri. Agora temos alguém através do qual consumarei mais um adultério semântico ao qual me proponho. Apenas mais um, como foram seus antecessores. Afinal, não é recente que me faço teu amante verbal, e confesso que acho bem mais divertida essa condição. Coitado, nem desconfia dos partos que farei entre as tuas pernas. Nem lhe passa pela cabeça que a mulher que tem ao seu lado anda grávida da minha prosa maldita por toda a eternidade.

E não é que me serviu de alguma coisa aquele poeta lírico e ridículo ao qual tu arrancaste uma das asas?! Ponho-me a pensar nas inevitáveis comparações que surgirão quando ganhares um presente desses que se compram nas lojas com aquilo a que chamam dinheiro. Quando te derem um buquê de flores, lembrarás que outrora ganhaste um jardim inteiro roubado no orvalho da aurora, de flor em flor, de rua em rua, e entregue com suor, invasão de condomínio, beijo na boca, colo e pedido de namoro. Quando receberes alguma carta com palavras entre aspas, dessas que transcrevem as pessoas comuns desprovidas de imaginação, recordarás não uma carta, mas o pedaço de chão que lhe foi concedido com escritos no original que só ao Mar pertencia o direito de apagar. Quando fizeres sexo lembrar-se-á dos transes que te levaram aos rios oníricos e que ao retornares ao cais ainda tinha-me dentro em ti. Nem imaginas o quanto me regozijo ao pensar sobre isso.


Ao menos tenha a discrição de não mais comentares nada, não aqui. Já que a pior das traições anda cometendo justamente neste exato momento em que os teus olhos ávidos discorrem por estas linhas e forma no rosto essa expressão mista de desprezo e admiração. Colocar-te-ei na boca a minha pena quando eu quiser. Não tens como fugires desta sina
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"Respeitar o trabalho do outro consiste justamente em submetê-lo à crítica mais rigorosa" (José Borges Neto)