segunda-feira, 19 de março de 2012

O Libertino

Não peças
Para que eu seja
O poeta do amor
Das coisas afáveis
Serei o poeta das putas
Porque é preciso haver poesia
Entre os abrires e fechares de pernas
Porque é preciso haver metalinguagem
Para que as coisas não se tornem meras
Vul ga ri da des

Traz nos ombros lembranças de velhos amores e outros escritos. Traz nos olhos confissões de que viveu sem se preservar. Traz na pele inscrições de abandono, descuido, excessos. E no riso traz delírios, traz nos beijos labirintos, nas mãos as ilegíveis linhas do tempo, nos pés tessituras de longas caminhadas. Alguém que fora um dia autor de várias personagens, que se fez delas enredo e acabou por se perder dentro dos cenários criados. Já não é possível viver outra coisa que não poesia, maldição.
Não será o poeta de uma palavra só. De modo algum abdica da carne dos seus amores literários, fazem parte do vasto vocabulário que exige a profissão de rufião semântico. Quer todas ao mesmo tempo, só assim é viável escrever um texto. A palavra solta, cultuada em única forma, não fomenta a literatura. Só é possível ser lido se houver poligamia textual. Mãos que o virgulam, pernas, parágrafos, coxas, seios de exclamação, gônadas de interrogação... E os termos vão se relacionando adulteramente até constituir orações com sentidos dúbios e diversificados. Amplo é o campo semântico de quem propõe amancebar-se.
Não esperará pelo acaso, ainda que casualmente lhe ocasione alguns casos. O acaso é tempo demais pra esperar. Quer a vida agora. Quer o sumo destes pomos, o sulco desta terra fértil, o vil odor destas secreções impregnando os tules, hastes de tulipas distribuídas nos cinzeiros do bordel e o suprimento etílico nas tabernas esfumaçadas.
Largou mão de ser escritor e agora vive como poeta, de flor em flor, vagando sem rumo, com rimas. Porque até mesmo um canalha precisa de afeto. Como aqueles homens do povo que adentram os lupanares em busca de afago para suas vidas sem sentido, assim também o é.


“Não há melhor túmulo para a dor do que uma taça cheia de vinho ou uns olhos negros cheios de languidez” Álvares de Azevedo em MACÁRIO.

4 comentários:

  1. "Largou mão de ser escritor e agora vive como poeta". a meu ver, você provocou um confronto entre a poesia e a literatura. Pôs a poesia como algo além. o ato de escrever não necessariamente está ligado ao ato de "poemar", isto ficou claro nesta simples frase! sobre o texto num contexto geral... tuas palavras apesar de bem selecionadas e tuas rimas são mundanas! o Bordel Semântico é o único "puteiro" que tem à poesia como a maior das putas! Paz e bem

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  2. Adoro esse teu jeito mundano de escrever!

    "Por trás dos desejos e paixões mundanas que a mente abriga, acha-se latente, clara e incorruptível, a fundamental e verdadeira essência da mente. "
    ( Sakyamuni )

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  3. Quem seria Ani sempre a me trazer um Neruda, um Drummond, um Buda, um agrado ? Me conheces? Será que me inventas? ...

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  4. Meu querido poeta,eu não o conheço! Achei teu blog por um mero acaso e me atrevi a comentar suas poesias,e hoje sou mais uma apreciadora deste seu bordel.
    Neruda, Drummond e outros é apenas minha forma de te retribuir o presente e o prazer que nos dá.
    Confesso que gosto mais das suas poesias mundanas,pois elas me penetram a alma e me fazem viajar em meus desejos e pensamentos mais profanos!
    Ah, é claro que eu também te invento,mas do que tu possas imaginar,já que sou uma eterna sonhadora e vivo de inventar!

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"Respeitar o trabalho do outro consiste justamente em submetê-lo à crítica mais rigorosa" (José Borges Neto)