quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Gauche


Errei pelas ruas e conheci os amores mais efêmeros. Numa esquina me apaixonei perdidamente e noutra já amava a lânguida face de uma cortesã sobre a pele do papel. Compus trovas, elegias às mulheres mais impuras. Sátiras às mais nobres. Desordenei o discurso. Fiz juras de amor interno, injúrias, desfiz os planos. Fechei bordéis, abri caminhos. Roubei jardins, interpretei os barcos. Saqueei aldeias e dediquei fenômenos da natureza. Invoquei os santos, as giras. Blasfemei em bocas devotas. Devotei em bocas devassas. Fiz oferendas. Dancei com o vento, mudei o curso das águas. Senti escorrer a tinta pelas veias e confundi vida e obra, guerra e paz, hamor e umor... Escrevi meu livro por aí. Não me preservei. Vivi, amei a mim mesmo como se fosse o último.

8 comentários:

  1. Mas o amor não é sinônimo de felicidade. No entanto falta algo, a catarse ao seu enredo.

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  2. Amar a mim mesma como se fosse o última, esta será minha trilha sonora. ;)

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  3. Ponntuação: seu enredo = sua "vida".

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  4. 1. Talvez a tal felicidade não esteja entre as minhas prioridades, talvez eu não dê demasiada atenção ao enredo e a catarse fica ao teu anônimo critério!

    2. Amar-se o bastante para se desconstruir. O abismo é logo ali.

    3. Vida!

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  5. O anonimato merece um poema!

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  6. Vamos, não chores.
    A infância está perdida.
    A mocidade está perdida.
    Mas a vida não se perdeu.

    O primeiro amor passou.
    O segundo amor passou.
    O terceiro amor passou.
    Mas o coração continua.

    Perdeste o melhor amigo.
    Não tentaste qualquer viagem.
    Não possuis carro, navio, terra.
    Mas tens um cão.

    Algumas palavras duras,
    em voz mansa, te golpearam.
    Nunca, nunca cicatrizam.
    Mas, e o humour?

    A injustiça não se resolve.
    À sombra do mundo errado
    murmuraste um protesto tímido.
    Mas virão outros.

    Tudo somado, devias
    precipitar-te, de vez, nas águas.
    Estás nu na areia, no vento...
    Dorme, meu filho.

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"Respeitar o trabalho do outro consiste justamente em submetê-lo à crítica mais rigorosa" (José Borges Neto)